quinta-feira, 20 de julho de 2017

CULTURA: ALAGAMAR: A arte que sustenta um lugar, uma terra rica de gente humilde

Localizada às margens do rio Brito, afluente do rio São Francisco, a aproximadamente 35 km da sede do município de Pirambu, o povoado Alagamar é o berço do artesanato oriundo da palha do ouricuri, uma planta nativa da região nordeste, que é utilizada pelos moradores desde gerações antigas para a fabricação de utensílios domésticos.


Alagamar 200 anos de existência

 De acordo com moradores, o povoado Alagamar data-se com mais de 200 anos. Indícios encontrados na pigmentação da cor da pele e de traços físicos dos nativos, comprovam que seus habitantes são remanescentes de quilombolas.
A região acidentada por morros e ladeiras, cortada por rios de águas doces, que se escondem em meio à Mata Atlântica foi de fato o local ideal para a instalação de um quilombo, construído por escravos que vinham de outras fazendas a fim de se refugiarem.

                Segundo registros históricos, no século 18, Sergipe passou a receber braços fortes de escravos vindo principalmente de Salvador e do porto de Pernambuco. Esses eram levados à vila de Estância, onde eram vendidos aos proprietários de engenhos e colonos da região.
 Os escravos que chegavam eram bastante explorados e maltratados, motivo esse, que os levaram a fugir de seus donos, e se esconderem próximos aos rios e matas fechadas.

 "A grande família"

                No povoado Alagamar, a família Santos é predominante, de acordo com relatos dos próprios moradores, há um forte grau de parentesco entre eles.  A tese quilombola foi comprovada na década de 1992 pelo morador José dos Santos, popularmente conhecido como “Zé Pedreiro”, um alagoano que mora na comunidade há mais de 20 anos. Através dele,  conseguiram  junto ao Congresso de Brasília o Registro de Identificação Quilombola.

                A fabricação do artesanato da palha do "Ouricuri" é uma atividade fortemente marcada pela origem negra, mas poucas pessoas da comunidade sabem de onde surgiu essa cultura artesanal.
 – “Desde os mais antigos é que se começou essa tradição, isso eu aprendi desde pequena com meus avós, então, quando se iniciou o povoado, já pode se registrar a cultura desse artesanato, logo se começou pela tabôa, fazendo esteirões, chapéus e côfo” – explica Dona Cândida.

Identidade territorial...

                 O artesanato dita as relações sociais que territorializam o povoado, reproduzindo o modelo de vida e refletindo sobre o oficio do artesão. Por isso, o "Ouricuri" torna-se tão comum na comunidade, pois, sua utilização é tão frequente que faz de sua utilidade a identificação das relações sociais que perpetuam à gerações.
                O artesanato atualmente tem sua função de gerador do desenvolvimento sustentável e social do povo alagamaense, além de ser o indicador do turismo local, seus produtos são exportados para outros estados.
Não é surpresa passar pelas ruas e ver mulheres sentadas no batente da casa com suas filhas fiando palha seca. A arte de fiar é tão importante para essas mulheres que sua atenção é totalmente voltada para o vai e vem dos fios, que graciosamente vão sendo enrolados no desenvolver do artesanato.

                O resultado do acabamento é o que irá atrair os clientes. Enquanto fala da arte e da importância de seu artesanato na comunidade, dona Cândida costura rapidamente uma bolsa que em minutos fica pronta – “De uns anos pra cá, a gente começou a fabricar bolsas, passadeiras de mesa, temos também peças que chamamos de enrolado que é um artesanato difícil porque leva mais tempo para ficar pronto, e nem todos conseguem fazer”. Enfatiza Cândida.

                O espírito empreendedor fez tanto sucesso entre as mulheres que até mesmo os homens se arriscam a tecer a palha do Ouricuri.

Claudio dos Santos, marido de Iranildes da Anunciação, declara que ajuda a esposa  na confecção dos produtos.
"O artesanato ajuda nas despesas de casa, então, quando temos tempo, nós homens ajudamos, seja na hora de buscar a palha no mato, seja quando tem que riscar a palha, no caso, separando o talo do linho, e quando a palha está seca, a gente faz tranças, é assim que a gente ajuda". Afirma Claudio. 

Inclusão social

As artesãs que já são aposentadas, veem esse oficio como uma saída para combater o desânimo que as assolam, pois, estando elas juntas, se alegram cantam, contam piadas, como declara a professora aposentada Doralice – “quando estamos juntas na associação, nós conversamos, rimos, falamos nossas besteiras engraçadas umas com as outras, e a mão na palha tecendo o artesanato”.  Conclui. 

Geração de renda...


                As relações sociais ultrapassam as fronteiras do povoado e alcançam experiências e conhecimentos. Foi com essa meta que a comunidade estabeleceu contatos com instituições que auxiliam o empreendedorismo em Sergipe. Conheceram novas técnicas e formas de trabalho, e foi através desse  incentivo que criaram o grupo “Raízes da Terra”.
“ Há oito anos trabalhávamos só com chapéus, depois nos reunirmos com a prefeitura, SEBRAE, Emdagro e a Universidade Federal de Sergipe, onde participamos de cursos e aperfeiçoamento. Daí começamos a desenvolver melhor nosso trabalho no grupo Raízes da Terra. Afirma Iranildes da Anunciação.
                 O resultado da parceria é que as vendas dobraram, pois, a aprendizagem proporcionou-lhes mais qualidade e inovação dos produtos. 
O maior fluxo de produção destina-se a capital do Estado, que conta com dois mercados de referência turística. Na capital, Aracaju, realizam-se anualmente feiras e exposições na orla marítima da Atalaia e no parque de exposições João Cleofas.

               O artesanato é a renda complementar da maioria das famílias da comunidade. É assim o cotidiano das  artesãs do povoado Alagamar, com a simplicidade de gente humilde, sorriso no rosto e as mãos cheias de calos do trabalho honesto, essas mulheres seguem construindo seu presente, na esperança de um futuro melhor.



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Jessica Feitoza e Laise Letícia

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