Localizada às
margens do rio Brito, afluente do rio São Francisco, a aproximadamente 35 km da
sede do município de Pirambu, o povoado Alagamar é o berço do artesanato
oriundo da palha do ouricuri, uma planta nativa da região nordeste, que é
utilizada pelos moradores desde gerações antigas para a fabricação de
utensílios domésticos.
Alagamar 200 anos de existência
De acordo com moradores, o povoado Alagamar
data-se com mais de 200 anos. Indícios encontrados na pigmentação da cor da
pele e de traços físicos dos nativos, comprovam que seus habitantes são
remanescentes de quilombolas.
A região
acidentada por morros e ladeiras, cortada por rios de águas doces, que se
escondem em meio à Mata Atlântica foi de fato o local ideal para a instalação
de um quilombo, construído por escravos que vinham de outras fazendas a fim de
se refugiarem.
Segundo
registros históricos, no século 18, Sergipe passou a receber braços fortes de
escravos vindo principalmente de Salvador e do porto de Pernambuco. Esses eram
levados à vila de Estância, onde eram vendidos aos proprietários de engenhos e
colonos da região.
Os escravos que chegavam eram bastante
explorados e maltratados, motivo esse, que os levaram a fugir de seus donos, e
se esconderem próximos aos rios e matas fechadas.
"A grande
família"
No
povoado Alagamar, a família Santos é predominante, de acordo com relatos dos
próprios moradores, há um forte grau de parentesco entre eles. A tese quilombola foi comprovada na década de
1992 pelo morador José dos Santos, popularmente conhecido como “Zé Pedreiro”,
um alagoano que mora na comunidade há mais de 20 anos. Através dele, conseguiram junto ao Congresso de Brasília o Registro de
Identificação Quilombola.
A
fabricação do artesanato da palha do "Ouricuri" é uma atividade fortemente
marcada pela origem negra, mas poucas pessoas da comunidade sabem de onde
surgiu essa cultura artesanal.
– “Desde os mais antigos é que se começou essa
tradição, isso eu aprendi desde pequena com meus avós, então, quando se iniciou
o povoado, já pode se registrar a cultura desse artesanato, logo se começou pela
tabôa, fazendo esteirões, chapéus e côfo” – explica Dona Cândida.
Identidade territorial...
O artesanato dita as relações sociais que
territorializam o povoado, reproduzindo o modelo de vida e refletindo sobre o
oficio do artesão. Por isso, o "Ouricuri" torna-se tão comum na comunidade, pois, sua utilização é tão frequente que faz de sua utilidade a identificação das relações
sociais que perpetuam à gerações.
O
artesanato atualmente tem sua função de gerador do desenvolvimento sustentável e
social do povo alagamaense, além de ser o indicador do turismo local, seus
produtos são exportados para outros estados.
Não é surpresa
passar pelas ruas e ver mulheres sentadas no batente da casa com suas filhas
fiando palha seca. A arte de fiar é tão importante para essas mulheres que sua
atenção é totalmente voltada para o vai e vem dos fios, que graciosamente vão
sendo enrolados no desenvolver do artesanato.
O
resultado do acabamento é o que irá atrair os clientes. Enquanto fala da arte e da importância de seu artesanato na comunidade, dona Cândida costura
rapidamente uma bolsa que em minutos fica pronta – “De uns anos pra cá, a gente
começou a fabricar bolsas, passadeiras de mesa, temos também peças que chamamos
de enrolado que é um artesanato difícil porque leva mais tempo para ficar
pronto, e nem todos conseguem fazer”. Enfatiza Cândida.
O
espírito empreendedor fez tanto sucesso entre as mulheres que até mesmo os
homens se arriscam a tecer a palha do Ouricuri.
Claudio dos
Santos, marido de Iranildes da Anunciação, declara que ajuda a esposa na confecção dos produtos.
"O artesanato ajuda nas despesas de casa, então, quando temos
tempo, nós homens ajudamos, seja na hora de buscar a palha no mato, seja quando
tem que riscar a palha, no caso, separando o talo do linho, e quando a palha
está seca, a gente faz tranças, é assim que a gente ajuda". Afirma Claudio.
Inclusão social
As artesãs que
já são aposentadas, veem esse oficio como uma saída para combater o desânimo que as assolam, pois, estando elas juntas, se alegram cantam, contam piadas, como
declara a professora aposentada Doralice – “quando estamos juntas na associação, nós conversamos, rimos, falamos nossas besteiras engraçadas umas com as outras,
e a mão na palha tecendo o artesanato”. Conclui.
Geração de renda...
As relações
sociais ultrapassam as fronteiras do povoado e alcançam experiências e conhecimentos.
Foi com essa meta que a comunidade estabeleceu contatos com instituições que
auxiliam o empreendedorismo em Sergipe. Conheceram novas técnicas e formas de
trabalho, e foi através desse incentivo que
criaram o grupo “Raízes da Terra”.
“ Há oito anos
trabalhávamos só com chapéus, depois nos reunirmos com a prefeitura, SEBRAE, Emdagro
e a Universidade Federal de Sergipe, onde participamos de cursos e aperfeiçoamento. Daí começamos
a desenvolver melhor nosso trabalho no grupo Raízes da Terra. Afirma Iranildes
da Anunciação.
O resultado da parceria é que as vendas
dobraram, pois, a aprendizagem proporcionou-lhes mais qualidade e inovação dos
produtos.
O maior fluxo de produção destina-se a capital do Estado, que conta com
dois mercados de referência turística. Na capital, Aracaju, realizam-se anualmente feiras
e exposições na orla marítima da Atalaia e no parque de exposições João
Cleofas.
O
artesanato é a renda complementar da maioria das famílias da comunidade. É assim o cotidiano das artesãs do povoado
Alagamar, com a simplicidade de gente humilde, sorriso no rosto e as mãos
cheias de calos do trabalho honesto, essas mulheres seguem construindo seu presente,
na esperança de um futuro melhor.
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Jessica Feitoza e Laise Letícia
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