Importa saber na atual conjuntura de crise qual a melhor estratégia para fortalecer a organização dos trabalhadores e enfrentar a escalada neoliberal e de direita.
O que une as forças de esquerda é o combate ao modelo neoliberal, em
especial contra as medidas mais ortodoxas que impedem o desenvolvimento
econômico e a redução das desigualdades. Todas
as correntes de esquerda defendem os direitos e as conquistas dos
trabalhadores, não aceitam as medidas que retiram recursos dos programas
sociais e não querem que o ônus da crise econômica gerada pelo
capitalismo seja colocado na conta dos trabalhadores.
O que divide as forças de esquerda é fazer defesa ou oposição ao
Governo Dilma Rousseff, do PT. Parte dessas forças entende que por pior
que seja o Governo Dilma, ao menos desenvolve algumas ações positivas
para a proteção da população mais pobre e dos trabalhadores. E que a
preservação do Governo Dilma servirá de trincheira para impedir maior
truculência da direita na aplicação do modelo neoliberal e na manutenção
das regras do atual “Estado Democrático de Direito”.
Outra parte dessas forças de esquerda entende que as alianças do
Governo Dilma com o empresariado, bancos, agronegócio e com partidos
conservadores e de direita, fortalece muito mais o modelo neoliberal e o
campo da direita do que as lutas dos trabalhadores e o campo da
esquerda. Tanto é que ocorreu forte crescimento da direita e dos grupos
conservadores, no Congresso Nacional e na sociedade, apesar dos
programas sociais dos governos Lula e Dilma.
No momento em que a estratégia adotada pelo PT ao longo dos governos
Lula e Dilma está sendo fortemente bombardeada por amplos setores da
sociedade, com risco de interrupção do segundo mandato de Dilma, as
forças de esquerda estão divididas entre as que consideram mais
importante proteger o Governo Dilma de eventual golpe da direita e as
que consideram mais importante fortalecer a mobilização e a organização
das classes trabalhadoras para impedir retrocessos sociais, venham de
onde vier, seja do atual governo de aliança com a direita ou de um
eventual novo governo de direita.
Para a parte da esquerda que mobiliza setores organizados da
sociedade (CUT, MST, UNE, MTST etc) na defesa do Governo Dilma contra o
impeachment, o foco da luta é impedir o avanço das forças conservadoras e
de direita que atacam diretamente o governo, embora do lado do Governo
Dilma tenha também partidos e grupos notadamente conservadores e de
direita, como os partidos PP, PR, PSD, e ministros como Kátia Abreu,
Helder Barbalho, Gilberto Kassab, Antonio Carlos Rodrigues etc. Ou seja,
a direita não está apenas do lado do impeachment, está também do lado
contra o impeachment.
Para a outra parte da esquerda, mesmo entendendo que o impeachment é
um golpe da direita contra o Governo Dilma, o foco da luta é contra toda
a direita e ao mesmo tempo contra essa estratégia do PT de fazer
alianças com a direita nos seus governos, já que tais alianças não
apenas proporcionaram a adoção de medidas da ortodoxia neoliberal contra
os trabalhadores como também fortaleceram, nos últimos 13 anos, os
grupos conservadores e de direita abrigados ou não nos governos do PT.
Do ponto de vista da luta dos trabalhadores, importa saber se a
defesa do Governo Dilma contribui efetivamente para o acúmulo de forças
no campo da esquerda não só para impedir o impeachment da presidente,
mas mais do que isso, impedir que no futuro imediato venham a ser
adotadas novas medidas econômicas e sociais contra os trabalhadores. A
desconfiança faz sentido porque o Governo Dilma atingiu duramente as
classes trabalhadoras logo após as eleições de 2014 com mudanças no
seguro-desemprego, no auxílio-doença, no benefício da pensão e também
nos cortes do ProUni, Pronatec, FIES e programa Minha Casa Minha Vida.
Da mesma forma, importa saber se após eventual impeachment da
presidente, com a quase certa saída do PT e de seus apoiadores do
governo, as forças de esquerda conseguirão fortalecer sua unidade em
torno da luta contra o modelo neoliberal e na defesa dos direitos e
conquistas dos trabalhadores. Pode ser que o PT, na oposição ao governo
federal, mude a sua estratégia de aliança com a direita e passe a
integrar de forma decisiva o campo da esquerda. Mas pode ser, também,
que mesmo após sofrer derrota no governo, o PT mantenha sua estratégia
de priorizar as alianças com a direita, como já vem acontecendo nas
coligações ensaiadas para as eleições municipais deste ano.
O que está evidente, para todos que têm compromisso com as lutas dos
trabalhadores, é que, independente do que acontecer no processo de
impeachment da presidente Dilma Rousseff, as forças de esquerda vão
precisar de muita unidade e muita combatividade não apenas para conter
os retrocessos gerais patrocinados pelo conservadorismo e pela direita,
mas principalmente para impedir que o governo nascido da crise adote
novas medidas contra os direitos e as conquistas sociais. Tudo indica
que a barra mais pesada ainda está para acontecer, com ou sem
impeachment.
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Hamilton Octavio de Souza é jornalista e professor.